domingo, 30 de setembro de 2007

Depois da chuva das duas


Texto de Maria Rojanski


“Meu pequeno menino, tanto relampeja, tanto é zinco este céu, tanto se anuncia esta chuva, a água ora parece a mais límpida, e é fria, é fria. O céu carregado de santa chuva conta-se chumbo, mas a tarde é tão clara, tão branca, querido. Meu pequenino. A copa da árvore cintila o verde das folhas e os jambos são mais saborosos quando assim molhados de chuva, quando assim a chuva é santa. A rolinha se esconde no regaço, acha abrigo entre os galhos. Vem, tu, menino querido, menino miúdo, também buscar teu abrigo, se aí estiver difícil. Aqui a rabeca arrebenta numa cantiga antiga, antiga, eu nunca vi. Não te sintas só, não fiques assim irritado, não te sintas magoado, não te digas pobre, que tu és grande. Tão grande, meu pequeno. Doce menino. Pálido e brando. É outubro, não te vejas um barco solto, não te vás mais para lá. Atraca neste porto e vem. Meu menino, é tão tolo dizer-te, mas a verdade é que ninguém tem culpa, é tão complicado, e não existe culpado. Não faça assim, enxuga teu olho de tua solidão. Se quiseres, se precisares, estou. Se não estiver bom, vem. Aqui tem música, aqui tem prosa, tem quem te ouça, tem colo e abraço, meu menino tão querido. Miúdo. Vem depois da chuva das duas da tarde, fazer passar tua dor”.

3 comentários:

Anônimo disse...

Parabéns a Maria pelo belo texto. De uma pureza tocante. Você já entrou naquele blog que recomendei? Ele se parece com o que você escreve. Veja lá o último post. ABS.

Anônimo disse...

Obrigada, minha pequena, minha doce Lai-Lai, por este texto que encontrei na sua gavetinha neste domingo tão vago... Ele diz do tamanho da alma que há nas coisas que você escreve. Manuel Bandeira disse que "as almas são incomunicáveis"... mas como, se cada palavra sua conhece tanto do que vai na alma da gente?

Fábio Luis Neves disse...

Ai ela é meu orgulho! hahahahaha
Esse texto é muito bom!