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A gente já sabia que as coisas têm nome, mas nunca tinha prestado atenção a quantas coisas as coisas têm, além do nome. Arnaldo Antunes então disse: As coisas têm peso, massa, volume, tamanho, tempo, forma, cor, posição, textura, duração, densidade, cheiro, valor, consistência, profundidade, contorno, temperatura, função, aparência, preço, destino, idade, sentido. As coisas não têm paz. E a gente passou a ver certas coisas com outros olhos, outros narizes e outras bocas.
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Vejam só quantas coisas tem a coisa janela, por exemplo. Tem tamanho, tem cor, tem lirismo e poesia. Nem posso imaginar outro nome para janela, ou outro nome para poesia. Aurora, então, é uma coisa que têm luz até no mome. Saudade, além de uma recôndita tristeza, tem reticências, tem extensão: que coisa comprida é a saudade...
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Sim, temos uma língua que batizou bem as coisas, embora haja coisas que ainda carecem de nome. Como se chama, por exemplo, aquela sensação que se tem na boca do estômago ao se lembrar de repente de algo que causou extrema emoção? Qual é o nome daquela valetinha situada logo abaixo da nuca de algumas pessoas – não de todas – que tem um cheiro intenso de feromônio? Como devo chamar a atitude de quem acha que pode arrancar folhinhas, colher uma florzinha daquela planta que nunca regou? Covardia? Não. Pensemos num nome menos eufêmico.
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Enfim, covardias à parte... Arnaldo Antunes é uma criatura doce. Ponto final.