
O porta-retratos estava abandonado há dias sobre o divã em sua sala. Nele, minha fotografia de três anos atrás, feita ao acaso, olhar distraído, mas feliz. Mais um dia fora de seu lugar e meu próprio rosto na fotografia poderia adquirir a expressão triste do abandono. Ele entrou com a animação de quem traz um presente, e tirou da pasta sob o braço um documento recém-impresso, cheirando à árvore e tinta. Antecipei um sorriso largo, antevendo o agrado. Como quem se prepara para mostrar uma relíquia, ele arredou o porta-retratos com dedos indiferentes, sentou-se no divã e me exibiu o pedigree do seu cão. O atestado da formidável linha de ancestralidade do seu animal. Olhei para ele com toda a intensidade, mas também com toda a serenidade que podia, e sem a menor sombra de incerteza, recomendei-lhe que o colocasse no porta-retratos.
3 comentários:
Minha mão continua estendida para sua amizade. Quando puder visite o meu blog. Adorei o seu.
Achei uma pérola do Pink Floyd outro dia, estava lendo a sua série de contos breves.
Diz o seguinte :
"Strangers passing in the street,
By chance separate glances meet
and I am you and
what I see is me",
o que daria
"Estranhos passam na rua,
Por acaso os olhares se cruzam,
E eu sou você, e
o que eu vejo sou eu."
Achei profundamente Lulirojanskiano. Grande abraço. Ótima semana, lembranças às filhas. Maria me esqueceu por completo ? Abração. Z.
Muito bom! Gosto desta série "Breve Contos", acho sua especialidade! Daria um belo livro se fizesse uma coletânea com eles.
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